domingo, 28 de julho de 2013

MHAM - 40 anos de história


 
Luiz Phelipe Andrés
Membro da Academia Maranhense de Letras

Caminhando pela Rua do Sol, no centro histórico de São Luís, área reconhecida pela Unesco como Patrimônio da Humanidade, há um grande sobrado de dois pavimentos e mirante, gradis de ferro e sacadas de pedra, de feição colonial mas que chama atenção pelo detalhe da portada em cantaria de lióz, de flagrante estilo neoclássico.
 
 
Em 28 de julho, completaram-se 40 anos desde que essa singular edificação tornou-se a sede do Museu Histórico e Artístico do Maranhão, órgão da Secretaria de Estado da Cultura, criado em 1968, no governo José Sarney, por inspiração de Josué Montello. A inauguração foi em 28 de julho de 1973, já no Governo Pedro Neiva de Santana.
Logo à entrada, o impacto visual do piso desenhado em lajes de cantaria e seixos rolados, característica muito própria dos grandes solares, que são destacados exemplares do valioso conjunto de arquitetura urbana. Neste “lobby” um faiscante lustre de cristal e uma escadaria monumental.
 
 
Nas faces internas dos janelões que ladeiam a entrada principal, interessantes detalhes das “conversadeiras”, assentos talhados na cantaria de grossa espessura das paredes frontais e donde os moradores podiam comodamente observar o movimento da rua.
Entrando-se na porta à direita, o cenário quase religioso da nave de um pequeno teatro particular, com palco elevado na boca de cena em arco pleno. Este foi batizado de “Teatro Apolônia Pinto”, em homenagem à maior atriz do Brasil do século XIX, famosa também por haver nascido, nos camarins do Teatro Arthur Azevedo em 1854.
 
 
Ao fundo do salão de entrada, o acesso ao pátio interno, em cujo piso central de pesadas lajes, está o poço d´água, acima do qual se ergue uma armação em hastes de ferro fundido com formato de cúpula, de cujo zênite descia a corda da caçamba.
À esquerda, abre-se o jardim que foi espaço de estacionamento dos coches e hoje ostenta um dos antigos chafarizes de metal das praças da cidade. Adiante, três magníficas esculturas em terracota inglesa, em tamanho natural, das deusas Minerva, Ceres e Mercúrio. No fundo do jardim, a casa de banhos com fachada de azulejos antigos.
 
 
Ao visitante, a certeza de estar em uma das mansões que abrigavam as famílias mais abastadas. Dentre elas a do major Inácio José de Souza, construtor do prédio em 1836, proprietário de terras e escravos de Itapecuru-Mirim e pai de Joaquim Gomes de Souza, que passou à história como grande intelectual, matemático, astrônomo, filósofo e pioneiro dos estudos matemáticos no Brasil.
 
 
Aqui o visitante pode fazer uma viagem no tempo e penetrar na realidade virtual de como viviam estes ancestrais maranhenses, os senhores e os escravos, protagonistas que foram de um modelo de economia colonial exportadora de produtos agrícolas e baseada numa ordem escravocrata e latifundiária.
 
 
É como entrar na intimidade e surpreender os detalhes a vida familiar cotidiana, desde onde viviam encafuados os escravos, no rés do chão, dos fundos da morada. A faina apressada das mucamas ao subir escadarias de serviço até onde estão os fogões à lenha, os grandes tachos, e as cristaleiras que guardam louças, porcelanas, pratarias e cristais, utensílios domésticos de época.
 
 
Percorrendo corredores laterais superiores, assoalhados com tábuas de madeira de lei pode-se alcançar a área mais íntima, e discretamente, a alcova, com a grande cama de casal coberta por um dossel e tendo ao seu lado o berço do bebê.
Até mesmo observar o indiscreto “trono” de madeira sob cujo acento vazado se escondia o urinol, de época em que não havia vasos sanitários com água corrente. Escarradeiras de porcelana decorada ficam ali deixadas nos cantos dos cômodos íntimos e também nas salas de visitas.
No escritório, sobre a escrivaninha descansam objetos como penas, tinteiros e mata-borrões, e a monumental estante de livros raros, doada à cidade de São Luís em 1902, pelo então presidente da República Argentina, Júlio Rocca, que abriga raríssimos documentos, incluindo manuscritos de Aluízio de Azevedo, ”O Mulato”, e “Malazarte”, de Graça Aranha. Há também o exemplar único do álbum de fotos originais de Gaudêncio Cunha, de São Luís em 1908 da Tipografia Teixeira.
Nos demais cômodos, exemplares do mobiliário maranhense da primeira metade do século XIX, esculturas, gravuras e grande retrato a óleo que, embora não seja, bem poderia ser a imagem da dona da casa, assim como outras pinturas clássicas, em molduras de madeira dourada.
 
 
Em sua origem o MHAM teve como referência, o tradicional Museu Histórico Nacional, mas as equipes técnicas em museologia, cedo identificaram sua verdadeira vocação de se constituir em “Casa Histórica” ou “Casa de Época” e, além disto, trabalhar na linha conceitual de Museu-Escola.
Ao implantar programações específicas para crianças e jovens que enchem de vida e alegria este sobrado, o MHAM também foi pioneiro ao realizar, ainda em 1978, a primeira visita programada para deficientes visuais de que se teve notícia no país.
Aqui o visitante encontra nossa identidade cultural assim como a crítica da realidade, favorecendo a produção de conhecimentos. E também opções de lazer com filmes, exposições, visitas monitoradas, espetáculos teatrais, palestras e debates.
Enriquecido desde sua fundação, o acervo possui mais de 8.000 peças distribuídas em sete espaços especializados. As artes plásticas e azulejaria encontram-se no “Museu de Artes Visuais”, na Rua Portugal. O de Arte Sacra no sobrado da Rua de São João que se liga ao prédio do MHAM pelo jardim interno e também nas Capelas de São José das Laranjeiras, de Bom Jesus dos Navegantes e Igreja do Desterro. O Museu Histórico de Alcântara/MA também é vinculado ao MHAM.
O anexo mais antigo e por questão de justiça social, o mais importante, é a Cafua das Mercês, inaugurado em 1975, com a finalidade de preservar a herança dos escravos. Trata-se da história contada pela ótica dos que foram oprimidos e explorados. Aí estão instrumentos de suplício que lembram o sofrimento dos negros.
As equipes técnicas seguem o Plano Museológico estratégico que norteia as ações em consonância com a Política Nacional de Museus do Ministério da Cultura, atendendo ao Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM). Ao comemorar seus 40 anos de atividade o MHAM se orgulha dos excelentes serviços prestados, sempre fiel ao compromisso fundador de “zelar pelo patrimônio maranhense, assim como divulgar e incentivar todos os segmentos da cultura”.

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