domingo, 24 de janeiro de 2010

Pará enciumando com base da Marinha no MA



Por Frank Siqueira, do Diário do Pará:

Belém – Tal como aconteceu há mais trinta anos, o Pará está levando mais uma “pernada” do Maranhão. Na década de 1970, Brasília decidiu que o minério de Carajás, produzido pela então Companhia Vale do Rio Doce – hoje Vale S.A., privada – seria escoado pelo porto da Ponta da Madeira, em São Luís. Com essa decisão, o governo descartou a hipótese da construção de um porto marítimo na Ilha de Tijoca, no município de Curuçá, e retirou do Pará a possibilidade de escoar o seu próprio minério. Uma moderna ferrovia foi construída, mas ligando a mina de ferro em Carajás, no sul do Pará, ao porto da capital maranhense, numa extensão de 892 km.

O Estado do Maranhão, aliás, vive um momento glorioso. No dia 15 deste mês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve lá, numa segunda visita em menos de dois meses, para, em companhia do senador José Sarney e da governadora Roseana, seus aliados, lançar a pedra fundamental da Refinaria Premim I da Petrobras. O megaempreendimento, orçado em US$ 20 bilhões, o equivalente a cerca de R$ 40 bilhões -, será construído no município de Bacabeira, a 58 km de São Luís.

Agora, outro megaempreendimento, cujos valores ainda não foram divulgados pelas autoridades de Brasília, será implantado na capital maranhense pelo Ministério da Defesa. Trata-se da Segunda Esquadra da Marinha do Brasil, que terá como base as águas da Ponta da Espera, na Baía de São Marcos. A nova base, concebida como parte integrante do planejamento da Estratégia Nacional de Defesa, implicará a transferência, para a micorregião da capital maranhense, de pelo menos seis mil militares. No total, considerando os familiares, o Estado receberá em torno de 12 mil pessoas diretamente ligadas à base da nova esquadra, segundo cálculos do próprio comando da Marinha.

Antes da definição por São Luís, o Ministério da Defesa chegou a estudar outras três possibilidades – Belém, Macapá e Chaves, município do extremo norte da Ilha de Marajó. Segundo a avaliação da Defesa, uma base naval em Macapá, só protegeria a entra do rio Amazonas. Belém, por seu turno, “só protegeria a Ilha de Marajó e a entrada do rio Tocantins”. Além disso existiria, em ambas as capitais, o problema da operação em dois tipos de água, doce e salgada, “cuja combinação deteriora fortemente os cascos dos navios”.

Bem ou mal, como se vê, o Ministério da Defesa tratou de dar uma explicação para a exclusão de Belém e Macapá do processo de escolha da sede da nova base naval da Marinha. O mesmo já não aconteceu em relação a Chaves, preterido igualmente, mas contemplado com um nada desprezível conjunto de avaliações positivas.

Depois de expor as restrições às duas capitais, o documento produzido pelo Ministério da Defesa diz que “uma base na Ilha de Marajó seria bem mais estratégica, pois protegeria toda a região, sem atrasos, com pronta resposta, por estar no cento e por estar muito mais próximo ao Atlântico, de onde viria a ameaça”. E ainda acrescenta, num comparativo com a capital paraense: “No norte da Ilha de Marajó, uma nova base naval em posição protegida, porém a pouca distância da linha do delta do rio Amazonas e totalmente voltada para o Oceano Atlântico, facilitaria ainda mais o cotrole estratégico da região e teria maior valor defensivo para toda Amazônia”.

Escolha de Cidade do Nordeste para proteger Amazônia

O Ministério da Defesa faz questão de informar que, para a Marinha, a escolha é técnica e levou em conta a estrutura portuária, as condições de navegabilidade na Baía de São Marcos, a grande variação de marés e características do litoral – reentrâncias e profundidade do canal marítimo. Todos esses parâmetros foram considerados favoráveis para operar embarcações 24 horas por dia. Além disso, observa a Defesa que a localização da Segunda Esquadra deixa a estrutura da Marinha mais próxima do apoio ao projeto Amazônia Segura, que prevê a instalação de 26 postos navais na região para aumentar a presença do Estado e a segurança territorial.

A avaliação da “escolha técnica”, porém, é contestada por dois técnicos paraenses com larga experiência no setor portuário. “Parâmetros técnicos são obviamente considerados, mas neste caso a decisão foi mais política do que técnica e, a meu ver, ainda pode ser revertida”, afirmou um desses profissionais, acrescentando que, em conversas reservadas, a opção por uma capital do Nordeste é objeto de questionamentos entre oficiais da própria Marinha.

Segundo outro técnico portuário, com formação de nível superior, as alegadas vantagens oferecidas pelo porto maranhense não se sustentam. “Do ponto de vista operacional isso não se justifica, já que nenhum navio da Marinha Brasileira tem mais de dez metros de calado”, disse. E acrescentou: “Como justificar a escolha de um Estado do Nordeste para abrigar uma força naval que tem, entre seus objetivos estratégicos, a missão de defender territorialmente a Amazônia, inclusive através de navegação interior?”.

Ele destacou, a propósito, uma informação contida no documento do Ministério da Defesa, em referência à possível escolha de Belém para abrigar a base da Segunda Esquadra da Marinha. “A vantagem de Belém seria contar com a já existente Base Naval de Val-de-Cães. Essa base já teve em outra época um ambicioso plano de obras em que ocuparia uma grande área, e nela existiriam 28 mil pessoas”.

Sem respostas

Segundo o mesmo documento, “no projeto, até hoje não executado, Val-de-Cães estaria em condições de oferecer apoio logístico a uma força naval composta de quatro navios de 12 mil toneladas, seis navios de 3 mil toneladas e dez navios fluviais de mil toneladas, o que totaliza 76 mil toneladas. “Tal base permitiria a atração de todos os meios em cais de 700 metros e em pieres com 645 metros totais”.

Diante dessa revelação, conforme destacou o segundo especialista, cabe ao menos a perguntar por que Belém oferecia no passado – e agora não oferece mais – condições técnicas para abrigar um “ambicioso plano de obras”. E mais: “porque razões esse plano deixou de ser executado e, o que é pior, descartado em definitivo?”. São essas indagações, por enquanto sem respostas, que intrigam e provovam discussões entre os poucos técnicos que no Pará têm conhecimento do assunto.

A reportagem do DIÁRIO tentou, por duas vezes, um contato com o Comando Naval do 4º Distrito Naval. Na primeira tentativa não houve resposta. Já na segunda, foi informada, na sexta-feira, de que o comandante não poderia se manifestar porque estava viajando.

Fonte: Blog do Décio Sá

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