quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Aírton Marinho, artista maranhense da xilogravura



José João Santos Lobato
Especial para o Alternativo


Raras têm sido as oportunidades de o público maranhense desfrutar de mostras retrospectivas de seus artistas. Fora as anteriores de Antônio Almeida organizadas por Roldão Lima na desaparecida galeria Eney Santana, durante a década de 80, e a por Ado Archangeli no Palacete Gentil Braga da UFMA, uma década atrás, nada mais foi visto, não obstante os vários artistas de artes visuais estejam há mais de três décadas atuando ativamente na vida cultural maranhense.
A retrospectiva de 30 anos de produção do artista Aírton Marinho se insere nesse cenário atípico.
A xilogravura escolhida pelo artista para elaborar suas obras é oriunda da velha Europa, redescoberta pelos expressionistas do século XX, e em tempos atuais artistas brasileiros como Gilvan Samico, Darel Valença Lins, Grillo, a usam como veículo na sua arte. Além de artistas intelectualizados como Goeldi que a reintroduziu no país, Scliar e Lívio Abramo; os cordelistas nordestinos muitas vezes anônimos fazem dela recurso para ilustrar as suas narrativas em versos na edição de seus libretos. Sendo uma arte aparentemente fácil, exige, no entanto muita habilidade na prática do desenho e principalmente na destreza compositiva no domínio do espaço formal. Como recuso gráfico permite um acesso mais democrático à arte, do que os originais únicos da pintura. É esse o processo que Aírton usa como único artista da gravura em São Luís.
Chegada - Este maranhense de conversa tranquila e simples, vindo de Vitória do Mearim, não deixa transparecer seu empenho obstinado, para com as coisas da arte, a quem o conheça no primeiro momento. Depois de chegar a São Luis após cursar o ensino primário, foi no Colégio Nina Rodrigues, do saudoso Carlos Cunha, que cursou o ginásio e o científico dos estudos secundários de então. Trabalhando na clicheria da Gráfica São José, foi pondo as mãos e os olhos no processo de gravar imagens para serem impressas. No Curso de Desenho Industrial do Instituto de Letras e Artes (ILA), da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), que era dirigido nos anos setenta pelo escritor e professor de Literatura Fernando Moreira, e sob a orientação da professora Cibele de Pádua, recém-chegada da FAAP de São Paulo, foi aprofundando sua técnica de gravura.
O ILA, que agregava os cursos de Comunicação, Licenciatura em Desenho e Plástica, Desenho Industrial e Letras, deu ao Maranhão uma geração de pintores, fotógrafos e escritores como: Murilo Santos, Miguel Veiga, Ciro Falcão, Sônia Almeida e outros. Profissionais que assumiram compromisso com os meandros sedutores da arte. Aírton explora seus temas por séries, através de um trabalho sistemático, que vai da pesquisa sobre o assunto elaboração das composições, até a impressão final no papel. Seu trabalho metódico desmistifica a imagem do artista como um iluminado pela sensibilidade, para quem uma organização profissional não é necessária.
Características - Nas suas imagens, a temática dos costumes regionais se transforma em uma exposição evocativa, aonde folguedos, festas religiosas, crendices, vão oferecendo motivação constante para sua atividade criativa. Esse universo rico que explora está há muito se esvanecendo em uma São Luís, que submerge na algaravia inconsequente da neuróticas cidades contemporâneas, quase sem espaço para as fantasias do imaginário popular de sua gente. De aparente simplicidade, as gravuras de Aírton, elaboradas em formas amplas e planas, sem detalhismos desnecessários, semeiam com figuras alegres o olhar dos espectadores. Sem preocupação descritiva de tipos, apresenta uma abordagem quase naif, dela se esquivando em climas visuais que através de uma composição elaborada e segura, tira dos temas uma vivacidade sugestiva. É importante sublinhar que a policromia é quase inusual na xilogravura, da qual tira um uso técnico e expressivo próprio e original. Mediante várias reimpressões entre amarelos, azuis, laranjas e vermelhos, ele pontua o branco do papel Rosaspin da tradicional Casa Fabriano da Itália, com silhuetas em negro, em um resultado onde em um simbolismo lúdico e telúrico é o mais enfático da sua estilização.
A título de reflexão quero, chamar a atenção dos leitores para certo marasmo e desinteresse que atualmente se instalou na relação do público maranhense com seus artistas plásticos. Talvez falte hoje em dia uma melhor formação, sensibilidade e entendimento que lhe permita ver, valorizar e consumir o bem de natureza natural que produzem os artistas que aqui vivem e enriquecem a vida cultural desta cidade que se orgulha de seus quatrocentos anos. O Maranhão tem dado ao país artistas de talento reconhecido como Flory Gama, Celso Antônio de Menêzes, Fernando P. e Floriano Teixeira. É graça a esta tradição passada entre gerações, que temos gente vivendo em um diálogo constante com o sensível e a simbologia da arte. Aírton Marinho se insere nesse cenário em que produzir é sempre um desafio constante. A homenagem que lhe é prestada nesse momento pela Fundação Municipal de Cultura (Func) é justa e em boa hora coloca o grande público em contato com as gravuras do artista, estreitando os vínculos entre a arte e nossa gente. A mostra está em cartaz na Galeria Zaque Pedro (Rua do Ribeirão). Aírton, um abraço caloroso e parabéns pela sua arte!
Artista Plástico e Professor de Arte

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